É sabido que em um momento anos atrás, meu desligamento religioso aconteceu. Não sei ao certo o dia, a hora, mas nada mais passou a fazer sentido.
Hoje vendo "Viver com Fé", Leonardo Boff foi perguntado se um dia a fé lhe havia faltado e ele disse que sim e depois completou lindamente o discurso, com o texto que segue:
Quem em algum momento não duvidou sobre a existência de Deus? Nessa confusão toda, eu disse talvez Deus seja nossa última profundidade. O Deus interior, aquela chamazinha que nós nunca devemos apagar e sempre alimentá-la e, é tão próximo a você que é você mesmo. Então, Deus é você pequeno como essa chama e, Deus é grande como o calor dessa chama. O profundo do ser humano que é seu mistério, que é inefável, é isso que nós chamamos Deus. Temos o corpo e tua presença em você, temos a interioridade que o mundo psíquico, onde temos demônios e anjos morando aqui dentro, tem o profundo que é aquela chama onde você sente que há uma presença no universo, nas pessoas, um fogo qualquer que te faz viver e isso pra mim é Deus. Como é possível uma flor que nem se abriu você logo cortar...qual o sentido nisso? O porquê, para que, de cada coisa que passamos e vivemos? Então, Deus pode ser aquilo que eu não entendo. Ele é mais do que eu, mas ele mora dentro de mim, e eu acolho isso como algo misterioso que não entendo mais um dia vou saber o mistério disso. A fé não vive sem dúvida, sem tentação. Certa vez, refugiado de guerra em campo de concentração ao presenciar criança ser enforcada se pergunta...onde está Deus? E no seu intimo escuta; Deus esta naquela criança sendo enforcada. A gente não entende, mas podemos ser mais generosos e dizer que Deus pode ser mais do que entendemos, porque não quero por a minha razão como critério para enquadrar Deus, ele desborda, por isso ele é mistério e, fica mistério em todo conhecimento e, diante do mistério vale a reverencia, vale o respeito, vale o silêncio, vale a lágrima e a entrega. Deus não é uma idéia, que a gente tem que fazer a passagem da cabeça pro coração e, é o coração que sente Deus, não a cabeça. Uma teologia só tem valor em seu efeito final, se for entusiasmo nas pessoas, se for alegria, se for elevação da vida. Todo mundo tem entusiasmo, levantar cada manhã, enfrentar o ônibus, ir pro trabalho, superar dificuldades, superar a tua crise, essa energia que te invade e que você não domina, e, se ela te falta você se acerta na depressão e alguns na morte, essa entusiasmo é o Deus interior e um Deus verdadeiro; e a fé tem que viver disso, não são as doutrinas, não são os dogmas, não são igrejas, templos, que representa fé, isso existe para suscitar essa chama interior, para mante-la viva e fazer com que as pessoas sintam isto. O lugar de Deus não é na razão, isso é o equivoco de toda cultura ocidental. O ser humano não é so razão, ele é capaz de êxtase, contemplação, ele é um ser utópico, um projeto infinito. O lugar de Deus é na dimensão do imaginário, na projeção, na utopia, do sonho, aí que é lugar de Deus, porque Deus é a plenitude desse sonho, ele é aquela base a partir do qual tudo emerge, sustenta tudo, suporta tudo, é o abismo alimentador de todo ser. É melhor o nobre silêncio do que tagarelar sobre Deus, porque Deus não se pode dizer, se deve calar.
É isso que eu acredito, é isso, dentro da gente, dentro a luzinha não pode se apagar porque senão o dia amanhã fica bem mais difícil.