quarta-feira, 6 de março de 2013

A gente nasce e morre só

Hoje foi um dia vazio. Eu não vou dizer triste porque de fato não foi, foi somente um dia repleto de horas vazias. Quando acordei e vi a notícia da morte do Chorão eu só lembrei da última vez que escutei e cantei aos berros o cd acústico mtv que tenho da banda. Álbum esse que eu acho fantástico, que já ouvi pra exorcizar feras, já ouvi chorando ao lado de um grande ex amigo, já ouvi por ouvir.

Não era fã, não seguia a banda. Gostava de algumas músicas e desse álbum em especial.
Agora por que esse vazio? Pela solidão da cena, da morte. Por lembrar que estamos num mundo tão ligados ao nosso umbigo, aos nossos desejos, às nossas atribuições que falta tempo pra lembrar de olhar pro lado e ver que alguém muito próximo está verdadeiramente precisando de atenção.

Quem já frequentou os dias negros da depressão sabe exatamente o valor de ter alguém que te mande um sms: "dê notícias" ou "quando quiser estou aqui" ou aqueles mais abusados que tocam a campainha ou ligam dizendo: "você desce ou vou ter que subir pra te tirar daí?"
Entendo de escolhas erradas porque já fiz muitas, entendo vícios porque tenho vários, entendo de silêncio porque gosto dele e convivo com muitos amigos monossilábicos. A parte que torna o fato  difícil ao meu cérebro e pior ao meu coração é entender que ninguém viu através daquela rebeldia, daquela tristeza que o fim poderia ser outro. E que aqui fique claro que não é a morte em si, é o todo. Ela, como sabemos, é nossa única certeza.


Um dia num voo pro Paraná eu passei mal pacas pois essa droga de alteração de pressão faz misérias com meu organismo. Um senhor sentado ao meu lado vendo meu desespero falou: esconda sua cabeça e chupe o dedo como se fosse um bebê, respire e você vai melhorar - e sim, passou. Dali em diante conversamos sobre o trabalho que ele gostaria de fazer pois trabalhava em plataformas de petróleo e um colega havia morrido na semana anterior. O homem assim que desembarcou tomou todas e acabou na traseira de um caminhão, irreconhecível. A tristeza de quem ficou era pensar como aquele mesmo homem trabalhou 15 dias embarcado e ninguém percebeu ou teve disponibilidade para descobrir que ali havia alguém desesperado.

O que aconteceu a esse rapaz, ao Chorão e tantos outros tantos que morrem da mesma forma e nem ouvimos me afeta como se fosse alguém que estimo, como se fosse parte de um núcleo o qual convivo e sim porque não esqueço que poderia ser qualquer um de nós.See de alguma forma você que lê esse texto não se fere com isso, há uma falta de sensibilidade aos olhos, ao coração e a alma.



Uma coisa eu tenho certeza (e aqui fica intrínseco um pedido ou meio que desabafo da felina), eu quero ter o direito de ouvir com todos aqueles que gosto, conheço, convivo, intensamente ou não quando estiverem nos bons e nos maus momentos. Quero ter a chance de dizer ao menos "fique calmo", "vem aqui", "vou aí", "vamos chorar juntos" e tornar um pouco acolhedor esse mundo quase sempre cão que vivemos.  Sim, sou um tipo sapiens daqueles estranhos, daqueles que por mais que não pareça, se importa com o que o outro sente. Já perdi muitas pessoas ao longo da minha pouca vida cheia de coisas que eu queria ouvir e outro punhado que eu queria falar. Que não se repita.


E, quando chegar a sua vez de ir para o Pai, aí, sem nenhum véu a separar a gente, vamos viver, em Deus, a amizade que aqui nos preparou para Ele. Você acredita nessas coisas ? Sim??? Então ore para que nós dois vivamos como quem sabe que vai morrer um dia, e que morramos como quem soube viver direito. Amizade só faz sentido se traz o céu para mais perto da gente, e se inaugura aqui mesmo o seu começo. Eu não vou estranhar o céu . . . Sabe porque ? Porque... Ser seu amigo já é um pedaço dele !
Vinícius de Moraes





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